Inteligência Artificial no xadrez
Considerado um jogo de tabuleiro estratégico e de tática, o xadrez é por muitos considerado como um treinamento mental. De fato, ele é reconhecido como o "esporte da inteligência". A partida é disputada em um tabuleiro de casas claras e escuras e confrontada por dois enxadristas, em que cada um controla dezesseis peças com diferentes características, cujo objetivo final é dar o xeque-mate no rei adversário do jogo.
A origem do xadrez
A origem do xadrez é atribuída à diferentes lendas e
mitologias de criação. Apesar de diversas civilizações reivindicarem a origem
de sua criação, estima-se que o xadrez tenha surgido na Índia por volta do
século VI. No entanto, o jogo foi na época denominado Chaturanga, e sua
característica primitiva e original difere do xadrez moderno. Ao longo da
passagem dos milênios, o xadrez foi difundido por todos os continentes, e
sofreu as primeiras modificações na Europa. Dessa forma, no início do século
XIX, o jogo foi consolidado em regras únicas.
O xadrez sob uma abordagem computacional
Atualmente, diversos estudos exploram o xadrez a partir do domínio da Inteligência Artificial. Nos últimos anos, diversos computadores capazes de jogar xadrez com elevado desempenho foram desenvolvidos. Sob a ótica da Inteligência Artificial, o objetivo da criação dessas máquinas é demonstrar sua superioridade perante o ser humano e explorar a capacidade da tomada de decisão diante de atividades e funções complexas.
Historicamente, em 1997, o supercomputador Deep Blue representou o grande marco para a Inteligência Artificial considerando o xadrez. Desenvolvido pela IBM e direcionado especialmente para partidas do jogo, o Deep Blue apresentava capacidade de analisar mais de 200 milhões de lances e posições a cada segundo. A máquina foi capaz de derrotar o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov em um jogo de seis partidas.
De acordo com os pesquisadores, diversos fatores contribuíram para o desempenho superior do Deep Blue, incluindo uma função de avaliação complexa do xadrez, o mecanismo de pesquisa utilizado, amplo conhecimento das funções básicas do jogo, ênfase em diferentes extensões de pesquisa e o uso eficaz da base de dados dos jogos Grand Master Chess. Apesar dos resultados promissores exibidos pela máquina, o uso da Inteligência Artificial no xadrez foi questionado por se tratar de um jogo altamente matemático.
Machine learning no xadrez
Diante desse contexto e após a realização de diversos campeonatos mundiais envolvendo máquinas enxadristas, em 2017, o Google criou o algoritmo AlphaZero em parceria com a companhia de Inteligência Artificial DeepMind. Em termos práticos, os programadores desenvolveram um programa que foi capaz de dominar o jogo em apenas 4 horas, aprendendo tudo sobre xadrez iniciando com somente as regras básicas do jogo. Durante esse período, o AlphaZero ficou jogando milhões de partidas contra si próprio com o intuito de tomar decisões e superar conclusões que o homem levou anos para compreender, graças ao machine learning. Tal característica representa um dos diferenciais do algoritmo, uma vez que seus antecessores eram criados a partir do acúmulo de uma ampla quantidade de informações e teorias enxadrísticas.
Além disso, destaca-se a ferramenta Stockfish, também direcionada ao jogo de xadrez e desenvolvida a partir da Inteligência Artificial. Em 2017, Stockfish e o algoritmo AlphaZero foram confrontados para que os pesquisadores pudessem avaliar a performance de ambas as tecnologias. Em 100 partidas, AlphaZero venceu 28 e empatou 72, demonstrando sua ampla superioridade. Já em 2018, o Stockfish foi atualizado e novamente confrontado com o algoritmo AlphaZero. No entanto, mais uma vez, AlphaZero demonstrou melhores resultados em relação à disparidade de tempo, e massacrou Stockfish no placar final, somando 839 vitórias em um confronto de 1000 partidas. Por tal razão, atualmente, o algoritmo AlphaZero é reconhecido como uma poderosa ferramenta que joga o xadrez mais forte do mundo.
Vale ressaltar que diversos algoritmos e sistemas computacionais não recebem devida atenção e investimento por parte da pesquisa científica. Ao contrário, por ser um jogo de estratégia, os programadores e cientistas de dados visualizaram o xadrez como um esporte com potencial de atingir um desempenho sobre-humano. Por tal motivo, os estudos foram mais ambiciosos e envolveram a Inteligência Artificial.
Respaldo científico
Em 2018, os programadores envolvidos no desenvolvimento do AlphaZero publicaram um artigo na renomada revista científica Science, revelando com detalhes a estrutura e os parâmetros desse algoritmo. Os pesquisadores relataram que o AlphaZero foi construído a partir de uma rede neural profunda, de acordo com os princípios do Deep Learning, e cosideraram ainda o algoritmo de busca Monte-Carlo, um método estatístico utilizado para obter aproximações numéricas de funções complexas, e capaz de auxiliar no processo de tomada de decisão em jogos como xadrez e pôquer.
Dessa forma, desde o advento do AlphaZero e a divulgação dos detalhes acerca de sua estrutura, surgiram novos projetos incorporando a Inteligência Artificial no xadrez. O Leela Chess Zero, por exemplo, representa um projeto de código aberto, gratuito e desenvolvido pelo programador Gary Linscott. Baseado em redes neurais, o projeto original do Leela Chess Zero foi lançado em janeiro de 2018 e, no mesmo ano, passou por modificações e atualizações em sua arquitetura e em determinados parâmetros visando replicar a estrutura e os resultados do AlphaZero.
Conclusão
Em geral, enxadristas consagrados concordam que a Inteligência Artificial representa uma estratégia promissora de alcance de desempenho, mas afirmam que ainda é necessário um estado de igualdade de uso de hardware e programação entre os diferentes algoritmos para que a disparidade entre tais projetos seja reduzida e demonstre resultados de maior confiabilidade.
Ao mesmo tempo, destaca-se que o jogo de xadrez ilustra o auge das pesquisas em Inteligência Artificial devido aos promissores resultados alcançados, revelando uma performance muito superior à capacidade humana. Os algoritmos de última geração são estruturados a partir do conhecimento das regras básicas do xadrez, porém baseados em poderosos mecanismos de pesquisa capazes de acessar em poucos segundos milhões de posições e calcular rapidamente as diferentes possibilidades de lances.
Atualmente, a Inteligência Artificial no xadrez tem
sido utilizada não apenas para permitir uma melhor compreensão acerca do jogo,
mas também para atingir a sua maior ambição no universo dos jogos, ou seja, auxiliar
no desenvolvimento de um sistema geral que seja capaz de dominar qualquer tipo
de jogo, independente de sua complexidade.